quarta-feira, 21 de abril de 2010

Crônicas futebolísticas

Pacaembu - 1942


Na visão de Nelson Rodrigues o estádio, os jogadores e a multidão não passam de um grande cenário, um pano de fundo para o que realmente representa, uma partida de futebol: “A metáfora da batalha vital de paixões e tragédias que movem a existência humana”. O futebol não era concebido em termos técnicos, táticos e esportivos. Nelson usava o esporte para falar da sociedade e de seus costumes. Através de suas crônicas tocou na psique do povo, falou das emoções humanas. “O juiz ladrão revolve, no time prejudicado e respectiva torcida, esse fundo de crueldade, de insânia, de ódio que existe, adormecido, no mais íntegro dos seres”. Ódio, amor, desejo e vontade. A natureza humana era representada pelo juiz, a torcida, o jogador e é claro, a bola.

Em campos potiguares, um que ainda joga com as palavras para falar de futebol, sociedade e vice-versa, é o jornalista Rubens Lemos Filho. Numa de suas crônicas Rubens fala do time de futebol como único bem inalienável que o homem possui. “Há os que se separam, os que trocam de carro, os que vendem ou alugam seus imóveis. Há, em escala ascendente, os que negociam a alma. O seu time, jamais, será objeto de permuta, sentimental, material ou imobiliária”. De acordo com o jornalista, o futebol é um dos elementos mais importantes na construção do imaginário popular do que significa ser brasileiro. O referido é verdade e dou fé.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

O Corpo fala...



Marcar o corpo com queimaduras por livre e espontânea vontade. Loucura? Falta do que fazer? Não acredito nisso. Falavam isso de tatuagem nos anos 80 e hoje até a Hebe deve ter uma na virilha. Um golfinho, talvez… Saiu do exótico e do herege para se tornar uma forma até aceitável de expressão pessoal. Tatuagem é uma camiseta de banda colada ao corpo pra sempre. É identidade. Uma marca. Estilo? Só mais agressivo do que gel pra cabelo. Feito de sentimentos diversos.

Tatuagem já não é exclusivo de um sentimento agressivo, não mais só feito de dragões e tubarões, mas também uma forma de expressar carinho e amor incondicional. O nome do filho, do deus, da mulher. Um Homer Simpson e um donut… Mas e os de espírito extremado, aqueles que se tatuaram antes, que foram pioneiros? Pra esses, tatuagem e outras formas de transformação do corpo são coisas sérias. Não basta expressar, é preciso chocar. Determinar quem é para todos. Um discurso mudo em loop.

E isso se torna uma droga, um vício. Assim como um homem que faz uma vaginoplastia, talvez tenham também nascido com a mente certa no corpo errado. E precisam consertar isso. São os que acreditam em mais do que a imagem para fora, mas a imagem para dentro. E isso não para. Tanto não parou que foram buscar maneiras mais incríveis de transformar o corpo e exaltar suas almas inquietas. Alargadores, piercings, mais piercings, chifres, caninos de vampiro, línguas de cobra… E agora, com vocês, o branding: desenhos não mais feitos com tinta, mas queimando com um ferro em brasa a própria pele.

Tão permanente quanto o decote daquela professora na memória de algum pré-adolescente. Falam sobre o cheiro de churrasco na sala. A dor incrível. O suor e o quase desmaio. O troféu. Uma marca. Uma brand, por assim dizer. Não dá pra imaginar que seja possível fazer esse tipo de transformação física sem antes ter havido alguma transformação no espírito. Algo precisa ser dito e extravasado. A pele começa a coçar, querendo expressar mais do que a quantidade de sol que você toma. E ela é marcada. Pra sempre. Alguns se dizem viciados em transformar o corpo. Querem além da relação de dor e prazer ativando a mesma parte do cérebro na hora de fazer as queimaduras programadas; querem também a relação entre o abstrato do pensar se tornando o concreto do dizer. Dizer com uma queimadura. Falar pela pele.